sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Mistagogia e Liturgia.

      A mistagogia "é, em primeiro lugar, a realização de uma ação sagrada e, em particular, a celebração dos sacramentos da iniciação cristã, Batismo e Eucaristia". Afirmar que a mistagogia é, em primeiro lugar, a ação litúrgica enquanto tal, significa atestar que a liturgia é, em si mesma, mistagogia, ou seja, é de per si capaz de ser epifania do mistério, de modo que a liturgia inicia ao mistério, celebrando-o.

       Para os padres da Igreja, portanto, a celebração dos mistérios é já iniciação aos mistérios e, desta maneira, o mistério se revela quando é celebrado, ele se comunica, se dá a conhecer. Isto significa reconhecer à liturgia a prerrogativa de ser ação teologal, isto é, ação de Deus em si mesma, e que ela, por isso, realiza aquilo que significa. Como se sabe, São Bento, jamais utiliza o termo "liturgia", mas, para indicar esta realidade, usa unicamente a expressão opus Dei, obra de Deus. 


      Definir a liturgia como opus Dei equivale a atribuir ao agir de Deus, na liturgia, as prerrogativas que as escrituras reconhece à Palavra de Deus, uma palavra que é em si mesma ação, por intermédio do profeta Isaías, revela a qualidade a qualidade da palavra que sai da boca de Deus: "E não volta sem produzir, sem ser realizado, sem fazer aquilo que planejei, sem cumprir com sucesso a sua missão" (Is 55, 11).


      Mistagogia "é a explicação oral ou escrita do mistério escondido na escritura e celebrado na liturgia". A mistagogia é, ao mesmo tempo, conhecimento do mistério contido nas escrituras e conhecimento do mistério contido na liturgia. O objeto de conhecimento é único: As modalidades de expressão são duas - A Escritura e a Liturgia. E o método de conhecimento para ambas é um só: a mistagogia. 

      A grande intuição espiritual que os Padres da Igreja expressaram em suas catequeses mistagógicas foi aquela de utilizar o método com o qual eles interpretavam as escrituras, para interpretar a liturgia. Utilizar um mesmo método de interpretação, uma mesma hermenêutica para duas realidades distintas significa reconhecer nestas duas realidades uma realidade profunda, essencial, mesmo reconhecendo a distinção e diferença e a preeminência das Escrituras sobre a liturgia.

      As escrituras são, sem duvida, norma da liturgia. Nesta estreita vinculação entre Escrituras e Liturgia, está todo o entendimento espiritual que os padres intuíram e concretizaram através da mistagogia. Nela está também toda a atualidade da mistagogia para a Igreja do nosso tempo.


Boselli, Goffredo. O Sentido espiritual da Liturgia,  
Coleção Vida e Liturgia da Igreja
Brasília, Ed. CNBB - 2014