segunda-feira, 14 de março de 2016

Sentir e saborear a Misercórdia.

Entranhas de Misericórdia

JO 8, 1-11


Jesus foi para o monte das Oliveiras. Ao amanhecer, ele voltou ao Templo, e todo o povo ia ao seu encontro. Então Jesus sentou-se e começou a ensinar. Chegaram os doutores da Lei e os fariseus trazendo uma mulher, que tinha sido pega cometendo adultério. Eles colocaram a mulher no meio e disseram a Jesus: "Mestre, essa mulher foi pega em flagrante cometendo adultério. A Lei de Moisés manda que mulheres desse tipo devem ser apedrejadas. E tu, o que dizes?" Eles diziam isso para pôr Jesus à prova e ter um motivo para acusá-lo. Então Jesus inclinou-se e começou a escrever no chão com o dedo. Os doutores da Lei e os fariseus continuaram insistindo na pergunta. Então Jesus se levantou e disse: "Quem de vocês não tiver pecado, atire nela a primeira pedra." E, inclinando-se de novo, continuou a escrever no chão. Ouvindo isso, eles foram saindo um a um, começando pelos mais velhos. E Jesus ficou sozinho. Ora, a mulher continuava ali no meio. Jesus então se levantou e perguntou: "Mulher, onde estão os outros? Ninguém condenou você?" Ela respondeu: "Ninguém, Senhor." Então Jesus disse: "Eu também não a condeno. Pode ir, e não peque mais".

Esta trecho do evangelho de João não parece em nada com o estilo do Evangelista João. Tem todo o estilo de Lucas, pois é conhecida a preocupação de Lucas em ressaltar todas as demonstrações de atenção de Nosso Senhor em relação à mulher e sua intenção de ultrapassar o quadro jurídico da lei no perdão e na misericórdia. Encaixaria muito bem em Lucas 21, 37-38 que faz várias alusões a Daniel. Aliás o capítulo 21 de Lucas poderia ser considerado, perfeitamente, como um Midrash de Daniel. 

O termo hebraico Midrash (em hebraico: מדרש; plural midrashim, "história" de "investigar" ou "estudo") é um método homilético (Pregação ou Formação textual) da exegese (Interpretação critica) bíblica. O termo também se refere à compilação integral dos ensinamentos homiléticos sobre a Bíblia. O Midrash é uma maneira de interpretar histórias bíblicas que vai além de simples destilação de ensinamento religioso, legal ou moral. Ele preenche muitas lacunas deixadas na narrativa bíblica sobre eventos e personalidades que são apenas insinuados.” (Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.)


Parece evidente, no entanto, que o evangelista tem diante dos olhos a mesma acusação de adultério que encontramos em Daniel capítulo 13; a mesma reviravolta da situação a mesma alusão aos velhos; a mesma preocupação dos acusadores em colocar sua vitima bem a vista; o mesmo apelo à lei de Moisés em lapidá-la.

Cristo se apresenta como o novo Daniel, justificando não apenas uma inocente, como fez o Jovem Daniel no Antigo Testamento, mas até mesmo perdoando uma culpada e demonstrando assim que o julgamento é graça, perdão e misericórdia.

Lá, Suzana era inocente e teve a vida poupada pela intervenção de Daniel, que representa o testemunho do povo justo, isto é, perfeitamente observante da Lei. Aqui a Adultera era culpada e foi poupada pela ação do Cristo que, como novo Daniel, é o embaixador da misericórdia do Pai, proclamando a nova lei do amor, da caridade, da graça. Fica ressaltada a humanidade de Cristo em oposição aos velhos escribas e fariseus.

Aqui a mulher adultera é a imagem da Igreja: pecadora, mas perdoada, culpada, mas convidada a não pecar. Experimenta a imensa misericórdia de Deus e nunca mais deixará de seguir o Cristo. Será a discípula fiel, porque perdoada e amada de maneira incondicional. 


A experiência do perdão – que a igreja faz, assim como a adultera fez – a experiência do amor de Deus no perdão recebido, a torna discípula fiel. Experimentar a ação misericordiosa de Deus na nossa vida é um caminho seguro do discipulado de Cristo, já agora.

Dessa maneira, no meio do templo, Jesus se apresenta como o Filho de Deus com entranhas de compaixão e misericórdia, do qual jorra a vida em abundância para essa mulher e nela para toda a humanidade necessitada.

Conhecer, experimentar a Deus !


Conhecimento pela fé em Cristo

Fil 3, 8-14


E mais ainda: considero tudo uma perda, diante do bem superior que é o conhecimento do meu Senhor Jesus Cristo. Por causa dele perdi tudo, e considero tudo como lixo, a fim de ganhar Cristo, e estar com ele. E isso, não mais mediante uma justiça minha, vinda da Lei, mas com a justiça que vem através da fé em Cristo, aquela justiça que vem de Deus e se apoia sobre a fé. Quero, assim, conhecer a Cristo, o poder da sua ressurreição e a comunhão em seus sofrimentos, para tornar-me semelhante a ele em sua morte, a fim de alcançar, se possível, a ressurreição dos mortos. Não que eu já tenha conquistado o prêmio ou que já tenha chegado à perfeição; apenas continuo correndo para conquistá-lo, porque eu também fui conquistado por Jesus Cristo. Irmãos, não acho que eu já tenha alcançado o prêmio, mas uma coisa eu faço: esqueço-me do que fica para trás e avanço para o que está na frente.  Lanço-me em direção à meta, em vista do prêmio do alto, que Deus nos chama a receber em Jesus Cristo.”

Este trecho da Carta de São Paulo aos Filipenses faz parte de um conjunto de bilhetes de Paulo aos seus queridos amigos daquela comunidade. Estes bilhetes foram dirigidos ao confronto com os perfeccionistas gnósticos. Sabemos que eles, pela GNOSE – do Grego conhecimento cada vez mais apurado – ascendiam à vida eterna com mais facilidade. Sem o conhecimento não tinham a herança eterna.


Paulo Faz apologia de seu ministério e de sua vocação. Além de alguns temas antigos, já tratados por Paulo, ele propõe várias teses novas particularmente importantes. Uma delas é a comunhão nos sofrimentos de Cristo que só é compreendida à luz das descobertas doutrinais que Paulo nunca deixou de fazer no decorrer de sua vida. 


Paulo sente a necessidade de justificar essa associação entre a morte de Cristo e a mortificação cristã. Mostra entre outras coisas, que o batismo faz do cristão um único corpo levado, numa só e única passagem, da morte à vida. Unido a Cristo, o cristão pertence-lhe por seu próprio corpo. Eis a razão pela qual seus sofrimentos tornam-se misticamente os de Cristo, especialmente quando originados da missão e do testemunho. 

No versículo 8 Paulo afirma que todas as vantagens adquiridas no judaísmo nada mais significam para ele. Ele nega, daqui por diante, qualquer valor aos sistemas oferecidos pela Gnose a seus adeptos, Paulo se aproxima de um velho tema sapiencial, com efeito, os Sábios já opunham sua inteligência das coisas de Deus ao pseudoconhecimento do mundo. 

Aliás, este conhecimento louvado por Paulo, é uma relação pessoal, uma “comunhão” com o poder vital de Cristo passando da morte para a ressurreição e que nos torna capazes, por sua vez, de passar da morte do pecado para a vida de Deus. O antigo testamento já havia apresentado o conhecimento de Deus muito mais como uma vivência do que como uma teoria.

Paulo partilha conosco que este conhecimento é atualmente participação na vida do Ressuscitado e renovação de nossa própria vida.

Diante de alguns cristãos orgulhosos e perfeccionistas, ele se apresenta como um homem em marcha e em busca, insatisfeito e mendigando a justiça divina. Ele ainda não chegou ao termo, no sentido de que ainda não acabou sua iniciação doutrinal ao Mistério de Jesus. Certamente ele se apresenta, não na direção de um ideal de perfeição intelectual ou moral, mas na direção do “prêmio da corrida”, isto é da ressurreição dos mortos.

O conhecimento que os gnósticos prezavam tanto para a chegada numa eternidade feliz - doutrina que tanto confundiu os primeiros cristãos, que pensavam que também necessitariam de muito conhecimento para chegar ao prêmio da ressurreição - é para Paulo uma experiência da fé em Cristo, experiência da ação da misericórdia do Senhor nas nossas vidas. Este conhecimento é supremo e supera todos os outros conhecimentos. Isto é: experimentar-se amado pelo Cristo e experimentar a graça de Deus atuando em nossa realidade de vida.

A experiência da misericórdia de Deus é o melhor conhecimento que se pode adquirir.